
Chico Buarque – Construção
16 de Abril, 2021
Miguel Torga – Viagem
16 de Abril, 2021Só a viagem faz por preceder as narrações
Do candeeiro da rua parte a luz descontínua
que todas as noites
ancora o infinito diante da minha janela
(após aquela ida à praia
o ano estava sempre a reiniciar-se,
meu caro Peter).
Pude assim tocar na cassiopeia como se a visse germinar
sobre um pequeno trecho de muro
repleto de heras
que me invade os olhos de música
são na verdade olhos agulha que se habituaram a
penetrar na liquidez dos solfejos
para escutarem o desencher de águas
por onde lentamente surgirá uma cabeça e depois
aquelas películas de paisagem sobre o couro cabeludo
que amaciam os fios da linguagem
e fico assim a saber
(sentado no sofá a teclar as aves que não se depenam
porque são orações)
que toda a metáfora da cal a ferver é um nascimento.
Nascer é recomeçar a espátula dos dias.
Nascer é uma imagem nua
e uma imagem nua é aquela figura de que nada
se depreende.
Razão por que toda a narrativa
(mesmo quela que se contou em Melinde)
possui uma cobiça própria
razão por que cada vestígio gravado na alvenaria
instrui sempre o seu tempo
(mas não a duração).
E como nada se depreende de uma incógnita
o horizonte não se deixa relatar
univocamente
daí o traço descontínuo da luz amarelada
do candeeiro de rua que me faz dragar o pensamento
antecipando marés
que a nada e a ninguém pertencem.
É por isso que vejo e revejo
com finita saudade
a vizinha a sacudir o tapete dos pavões
ou o senhor Fernando que serve à mesa no restaurante
do bairro e que foi operado aos pulmões
vejo e revejo a merceeira que me vende a broa de milho
ou o gerente do banco
esse pedúnculo frágil que decidiu pavimentar as vésperas
para evitar as gorduras peçonhentas e os noves fora
nada.
Vejo-os cada qual no seu quadrante
a digerir o passar de horas sem qualquer glúten
num tempo homogéneo
de que me separo todos os dias
porque não pertencer é alimentar uma esperança
em estado sólido
e como dirás no teu poema
tudo isto se repete como os lançamentos de linha lateral
aos fins de tarde
mas nada nesses arremessos episódicos
nos brindará alguma vez com as aragens da duração.
Concordo contigo que a majestade dos instantes
pode ser um isco
ou mesmo um risco
talvez um conjunto de riscos
preferia chamar-lhe uma assinatura.
Bem sabemos os dois que uma assinatura não é um nome
nem é uma escrita
nem é parte seja do que for.
Uma assinatura é uma formiga precária
um teatro feito de tatuagens fugidias
que de cada vez que se encena apenas a si se representa.
E a mais não aspira por ser uma crisálida
em fuga
ou um estado de listas passageiras
como uma épica a que não mais se regressa.
Sem as vigias cerradas cheguei à praia
nessa manhã de inverno
e tudo continuava ainda por nascer
ao contrário do que eu pensava
tudo aves e fungos e vagas a lamber os riachos da maré baixa
e as crucíferas nuas como as imagens
a apascentarem as esplanadas e o cheiro do lingueirão
foi então que desmatei as pequenas ondas e me pus a
apagar os verbos todos da proposição
apesar de o hemisfério direito do cérebro
melodizar os artigos definidos e os livres
indirectos
(as abelhas continuavam
a polvilhar estranhamente na areia molhada)
e de o hemisfério esquerdo detalhar os petroleiros
ao longe
esfumados
tão larga e bela era a vista
e já com tanto medo (ela mesma) de se perder
fossem os toldos ainda ausentes
ou as aves
eram afinal gaivotas a reconstruir as últimas notas
para que a sequência
parecesse estar a ocorrer agora no presente.
que todas as noites
ancora o infinito diante da minha janela
(após aquela ida à praia
o ano estava sempre a reiniciar-se,
meu caro Peter).
Pude assim tocar na cassiopeia como se a visse germinar
sobre um pequeno trecho de muro
repleto de heras
que me invade os olhos de música
são na verdade olhos agulha que se habituaram a
penetrar na liquidez dos solfejos
para escutarem o desencher de águas
por onde lentamente surgirá uma cabeça e depois
aquelas películas de paisagem sobre o couro cabeludo
que amaciam os fios da linguagem
e fico assim a saber
(sentado no sofá a teclar as aves que não se depenam
porque são orações)
que toda a metáfora da cal a ferver é um nascimento.
Nascer é recomeçar a espátula dos dias.
Nascer é uma imagem nua
e uma imagem nua é aquela figura de que nada
se depreende.
Razão por que toda a narrativa
(mesmo quela que se contou em Melinde)
possui uma cobiça própria
razão por que cada vestígio gravado na alvenaria
instrui sempre o seu tempo
(mas não a duração).
E como nada se depreende de uma incógnita
o horizonte não se deixa relatar
univocamente
daí o traço descontínuo da luz amarelada
do candeeiro de rua que me faz dragar o pensamento
antecipando marés
que a nada e a ninguém pertencem.
É por isso que vejo e revejo
com finita saudade
a vizinha a sacudir o tapete dos pavões
ou o senhor Fernando que serve à mesa no restaurante
do bairro e que foi operado aos pulmões
vejo e revejo a merceeira que me vende a broa de milho
ou o gerente do banco
esse pedúnculo frágil que decidiu pavimentar as vésperas
para evitar as gorduras peçonhentas e os noves fora
nada.
Vejo-os cada qual no seu quadrante
a digerir o passar de horas sem qualquer glúten
num tempo homogéneo
de que me separo todos os dias
porque não pertencer é alimentar uma esperança
em estado sólido
e como dirás no teu poema
tudo isto se repete como os lançamentos de linha lateral
aos fins de tarde
mas nada nesses arremessos episódicos
nos brindará alguma vez com as aragens da duração.
Concordo contigo que a majestade dos instantes
pode ser um isco
ou mesmo um risco
talvez um conjunto de riscos
preferia chamar-lhe uma assinatura.
Bem sabemos os dois que uma assinatura não é um nome
nem é uma escrita
nem é parte seja do que for.
Uma assinatura é uma formiga precária
um teatro feito de tatuagens fugidias
que de cada vez que se encena apenas a si se representa.
E a mais não aspira por ser uma crisálida
em fuga
ou um estado de listas passageiras
como uma épica a que não mais se regressa.
Sem as vigias cerradas cheguei à praia
nessa manhã de inverno
e tudo continuava ainda por nascer
ao contrário do que eu pensava
tudo aves e fungos e vagas a lamber os riachos da maré baixa
e as crucíferas nuas como as imagens
a apascentarem as esplanadas e o cheiro do lingueirão
foi então que desmatei as pequenas ondas e me pus a
apagar os verbos todos da proposição
apesar de o hemisfério direito do cérebro
melodizar os artigos definidos e os livres
indirectos
(as abelhas continuavam
a polvilhar estranhamente na areia molhada)
e de o hemisfério esquerdo detalhar os petroleiros
ao longe
esfumados
tão larga e bela era a vista
e já com tanto medo (ela mesma) de se perder
fossem os toldos ainda ausentes
ou as aves
eram afinal gaivotas a reconstruir as últimas notas
para que a sequência
parecesse estar a ocorrer agora no presente.
Luís Carmelo
[Évora, 1954]

Ficcionista, ensaísta e cronista.
Estudou Sociologia e Estudos Árabes em Portugal. Licenciado em Línguas e Literaturas Modernas / Variante de Estudos Portugueses na Universidade de Utreque (Holanda, em 1990) e doutorado na mesma universidade (1995) com a dissertação La représentation du réel dans des textes prophétiques de la littérature aljamiado-morisque, foi professor na Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa e é, desde 1990, professor associado na Universidade Autónoma de Lisboa (UAL), onde dirige a área de Semiótica nos estudos de Ciências da Informação.
Fundou e dirige a Escola de Escrita Criativa Online (EC.ON) e é membro da Associação Internacional de Semiótica (IASS-AIS).
Centro de Documentação de Autores Portugueses
01/2014
Estudou Sociologia e Estudos Árabes em Portugal. Licenciado em Línguas e Literaturas Modernas / Variante de Estudos Portugueses na Universidade de Utreque (Holanda, em 1990) e doutorado na mesma universidade (1995) com a dissertação La représentation du réel dans des textes prophétiques de la littérature aljamiado-morisque, foi professor na Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa e é, desde 1990, professor associado na Universidade Autónoma de Lisboa (UAL), onde dirige a área de Semiótica nos estudos de Ciências da Informação.
Fundou e dirige a Escola de Escrita Criativa Online (EC.ON) e é membro da Associação Internacional de Semiótica (IASS-AIS).
Centro de Documentação de Autores Portugueses
01/2014

Olho Marinho
Olho Marinho é uma freguesia portuguesa do município de Óbidos.
Desde a Idade Média, que o Centro Histórico-ambiental de Olho Marinho e sobretudo, os seus Olhos d’ Água, são olhados como um local romântico, particularmente desde os primeiros anos do século XIV.
Aqui existe uma fonte onde D. Inês de Castro tratava a sua pele e os seus olhos.
A principal festividade anual do Olho Marinho celebra-se na segunda quinzena de Agosto, em honra do Imaculado Coração de Maria, a quem a freguesia foi consagrada em finais do século XIX. Para além do seu carácter religioso, que tem o ponto alto na bela procissão que percorre as ruas da localidade, a festa pretende ser um ponto de encontro de todos os emigrantes da freguesia.
Também em Agosto se realiza, no dia 15, o Festival de Folclore, promovido pelo Rancho Folclórico "Os Populares" do Olho Marinho, e que reúne ranchos dos mais diversos pontos do país. Outro momento importante é a Feira de Santo António, que se realiza todos os anos, no dia 13 de Junho, com uma forte componente de animação.
Pontos de interesse: http://www.olhomarinho.net/
Nascente
Igreja Imaculado Coração de Maria
Centro histórico
Parque Desportivo
Quinta do Furadouro (estação de biodiversidade)
Planalto das Cesaredas
Diversos pontos de miradouro
Percursos Pedestres:
Rota do Calcário - PR13 (em fase de implementação)
Rede de Caminhos Antigos Olho Marinho/Planalto das Cesaredas (em fase de implementação)
Desde a Idade Média, que o Centro Histórico-ambiental de Olho Marinho e sobretudo, os seus Olhos d’ Água, são olhados como um local romântico, particularmente desde os primeiros anos do século XIV.
Aqui existe uma fonte onde D. Inês de Castro tratava a sua pele e os seus olhos.
A principal festividade anual do Olho Marinho celebra-se na segunda quinzena de Agosto, em honra do Imaculado Coração de Maria, a quem a freguesia foi consagrada em finais do século XIX. Para além do seu carácter religioso, que tem o ponto alto na bela procissão que percorre as ruas da localidade, a festa pretende ser um ponto de encontro de todos os emigrantes da freguesia.
Também em Agosto se realiza, no dia 15, o Festival de Folclore, promovido pelo Rancho Folclórico "Os Populares" do Olho Marinho, e que reúne ranchos dos mais diversos pontos do país. Outro momento importante é a Feira de Santo António, que se realiza todos os anos, no dia 13 de Junho, com uma forte componente de animação.
Pontos de interesse: http://www.olhomarinho.net/
Nascente
Igreja Imaculado Coração de Maria
Centro histórico
Parque Desportivo
Quinta do Furadouro (estação de biodiversidade)
Planalto das Cesaredas
Diversos pontos de miradouro
Percursos Pedestres:
Rota do Calcário - PR13 (em fase de implementação)
Rede de Caminhos Antigos Olho Marinho/Planalto das Cesaredas (em fase de implementação)