ANTÓNIO DA SILVEIRA MALHÃO
2 de Maio, 2023ODETTE DE SAINT MAURICE
2 de Maio, 2023PADRE FRANCISCO RAFAEL DA SILVEIRA MALHÃO
QUADRA JUNTO A N. SR. DO ROSÁRIO
(Ana Matos, intérprete)
Suspende os passos, oh filho,
Sem me honrar não vás além;
Se precisares de Mim,
Fala, e verás que sou Mãe!
in Luís Marques da Gama, Os Malhões de Óbidos
SONETO A N. SR. DA PIEDADE
(Ana Matos, intérprete)
Caminhante, suspende um pouco os passos!
Fita os olhos no quadro doloroso
Da terna Mãe, que o Filho affectuoso
Sustenta morto sobre os debeis braços!
O Filho, que dos celicos espaços
Veio remir o mundo criminoso,
E posto no patibulo affrontoso
Quebrou da raça humana os ferreos laços!
Salve! lhe diz: ó Mãe da humana gente,
De piedade e d’amor fóco divino,
A voz do passageiro ouve clemente!
Reza a Salve, oração do Peregrino!
Pede-lhe a bênção! curva humilde a frente!
Faz o sinal da cruz! vae teu caminho!
in Joaquim da Silveira Botelho, Óbidos. Vila Museu
A AVEZINHA E O MOSTEIRO
(Frei e Vicente, música e adaptação)
Quando há pouco atravessei
O ermo de Val' Benfeito,
Todo em silêncio perfeito,
A natureza dormia.
Somente duma avezinha,
Sobre um pinheiro pousada,
A voz, sentida e magoada,
D'espaço a espaço gemia.
Era gemer que não tem
Semelhante neste mundo,
Mais extenso que profundo,
Sobre triste, penetrante.
Não são assim os gemidos
D'algum dos seres viventes,
Nem os ais intercadentes
De mortal agonizante.
Talvez (que não pode Deus!)
Seria a alma dum monge
Que ali viesse de longe
Saudades desabafar;
Do seu antigo mosteiro
A fatal destruição,
As ruínas que ali vão,
Metida na ave, chorar.
Ou seria anjo do Céu
Que das nuvens desceria,
E vindo de romaria
Àquele santo lugar,
Lá de cinta do pinheiro
Que verdeja na colina,
Ao ver tamanha ruína,
Se pôs defronte a chorar.
Quem sabe? Conto o que vi
E o que pensei, tal e qual.
Se foi caso natural,
Se foi mistério, não sei.
Sei, porém, que da avezinha
A triste voz escutando,
Tanto estrago contemplando,
Também lágrimas chorei.
Qual o monge e qual o anjo,
Se anjo ou monge ali vagava,
E como eu, que ali passava,
Chora todo o coração,
Vendo a ruína das artes,
A do asilo da piedade,
E a brutal barbaridade
Da presente geração.
in João Trindade, Memórias Históricas
O P.ᵉ Francisco Rafael da Silveira Malhão foi um dos quatro filhos, havidos do casamento do Dr. Francisco Manuel da Silveira Malhão com Josefa Margarida de Oliveira e Gama. Nasceu em Óbidos, numa casa da Rua Direita, em 1794.
Desde cedo, Francisco foi preparado para a vida eclesiástica. Durante a adolescência, ficou órfão de pai, mas tal não o impediu de prosseguir os estudos no Seminário Patriarcal de Santarém. Tomou ordens em 1817 e regressou a Óbidos, sendo nomeado beneficiado da Igreja de São Pedro. Foi sócio correspondente do Instituto de Coimbra. Faleceu em 1860.
Luís da Gama considera o P.ᵉ Francisco Malhão “o maior orador sagrado do seu tempo, erguendo a eloquência sagrada ao mais alto nível literário que entre nós se pôde atingir depois de Vieira e de Bernardes”. Além da palavra inflamada, os seus sermões revelam conhecimentos formais de teologia, conhecimentos de história e vastos conhecimentos de literatura. Destacou-se também como poeta, de temas religiosos e profanos.